© Alvaro Perdices

NIÑO DE ELCHE – Colombiana

Teatro das Figuras, Faro / Sex 18 OUT 21H30

MÚSICA / 80' / M6 / 5€ a 10€* - COMPRAR 
*10€ Bilhete Normal / 7,5€ Maiores 65 / 5€ Menores 30

Todo o flamenco é uma canção de ida e volta. Não apenas guajiras ou milongas, mas também a soleá e a seguiriya, romances, cabales, peteneras e pregones no vasto Caribe Afro-Andaluz. E o fandango, claro.

Esta viagem é a mesma que fizeram o açúcar, o café, o cacau, o rum de cana. Mas esta viagem foi interrompida entre 1810 e 1898, fazendo com que o flamenco voltasse a ser como era antes.

Com este novo álbum, Colombiana, Niño de Elche procura dar continuidade a essa relação que era tão fluida, tão frutífera, tão florescente. Apesar de não se tratar de arqueologia desta vez, mas antes de antecipação: aqui encontramos o flamenco que vem a caminho. O flamenco do futuro está ao virar da esquina.


Voz: Niño de Elche
Guitarras: Raúl Cantizano
Sintetizadores e electrónica: Susana Hernández (Ylia)
Percussão: Víctor Martínez
Desenho de Som: Raúl Lorenzo
Desenho de Luz: Benito Jimenez
Produtor: Estefania Serrano
Apoio: Acción Cultural Española (AC/E): Programa para a Internacionalização da Cultura Espanhola (PICE) / Mobilidade

Niño de Elche é um invulgar cantaor (cantor de flamenco). Artista multidisciplinar que combina o canto flamenco e toque com performance, poesia, improvisação, minimalismo, canto e composição, rock ou electrónica. Lançou álbuns muito diversos, como Mis primeros llantos (2007), Sí, a Miguel Hernández (2013) ou Las malditas órdenes del tenente coronel (2013), produzido juntamente com a banda de improvisação Seidagasa.
Conjuga os seus trabalhos pessoais com colaborações com criadores de arte difíceis de classificar, como o filósofo e curador de arte Pedro G. Romero ou o poeta Antonio Orihuela. Mas também no desenvolvimento de Coplas Mecánicas, uma criação de cruzamento disciplinar juntamente com o bailarino de flamenco Israel Galván.
Colabora também com bandas espanholas de rock, pop ou experimental como Pony Bravo, Kiko Veneno, Toundra ou Los Voluble.
Segundo o jornal El País, “Niño de Elche tornou-se aqui e agora um dos nomes mais reverenciados pelo público da música”.


Grupo de Crítica VA9 – Textos

Sobre o concerto Colombiana de Niño de Elche
Texto de Martim Santos, aka Lágrima
Confesso que não estava preparado. Não costumo ler muito, nem bisbilhotar, sobre os artistas, maioritariamente deixo-me levar pela conjuntura da proposta e deixo que a minha intuição viva as ansiedades, tranquilamente, como só ela sabe e por norma isso escapa no exame final, mas desta vez não escapou.
Era sexta-feira e ela dizia-me que ia presenciar uma desconstrução contemporânea de um artista com carisma, ‘avantgarde’ mas desta vez saiu-lhe curta a arte divinatória, como já referi.
‘El Niño’ não só hipnotizou a plateia como a presenteou com um guia de viagem no qual nada foi deixado ao acaso. Cada gesto tomava proporções teatrais, cada palavra, nota ou onomatopeia (e outras coisas do mesmo género) sublinhou a sua necessidade de tomar o seu objecto artístico como algo vivo e bestial, uma necessidade de sair dos formatos clássicos que tão bem conhece mas que não se fica por procurar uma perspectiva ‘fora da caixa’ – aquele homem morde a caixa, cospe a caixa, abraça a caixa, conta-lhe piadas inteligentes, é irreverente e ainda tem uma classe digna de um Anti-Herói bêbado a segurar um charuto aos olhos de uma princesa apaixonada. A caixa, coitada, acabou violada a ouvir ‘dark-techno’ numa discoteca suja e escura, com virgindades perdidas onde nem sonhava ter entradas sequer.
O flamenco surge como linguagem base mas tudo o resto é livre ou caótico ou genial, depende de quem votaste nas últimas eleições (piada). Uma verdadeira lição de como fazer música com o que está à mão, ou ao pé, ou utilizando a boca para modular as notas fazendo caretas ao mesmo tempo ou simplesmente emitindo grunhidos enquanto se finge chorar.
Talvez ao ouvido menos técnico Niño de Elche seja um animador ‘entertainer’ com rasgos de Screamin’ Jay Hawkins numa trip de Ayahuasca mas tudo que ele faz tem considerável dificuldade técnica (de um ponto de vista teórico) e fugindo aos rótulos que ele tanto ama (ironia), acaba por ser nada menos que uma performance cheia de intenção, mensagem, heranças étnicas e uma vontade “filha da puta” de rasgar com os preconceitos da indústria musical e das frustrações humanas. O público, esse, tal como o próprio disse foi: inteligentíssimo e aplaudiu o ‘senhor’ de pé, e eu que não estava preparado sai de lá sem ressaca nenhuma que foi um milagre dos Deuses. Amém!
24 de Outubro 2019